3.1415926535...


 …8979323846 2643383279 5028841971 6939937510 5820974944 5923078164 0628620899 8628034825 3421170679… O leitor estará a perguntar-se: será que estes dois estão bons da cabeça?! Que números são estes? Não sabemos se a sua opinião sobre nós melhorará ao revelarmos que esta é apenas uma ínfima parte de uma sequência infinita. Por isso, rejubile! Limitámo-nos a listar apenas os 100 primeiros dígitos da constante matemática π (pi).

A descoberta de que a razão entre a circunferência e o diâmetro de um círculo é constante – representada por π – surgiu na antiguidade e tem fascinado a humanidade desde então. Os antigos egípcios e babilónios mediram-na; génios gregos como Arquimedes demonstraram-na e estabeleceram limites (entre 3,1408 e 3,1428); estudiosos chineses e indianos refinaram a sua precisão; e matemáticos medievais e modernos revelaram a sua verdadeira natureza. O que começou como uma simples observação em objetos circulares transformou-se numa constante matemática profunda. Assim, a história de π é um testemunho de descobertas interculturais, refinamento contínuo e compreensão gradual, demonstrando que esta razão universal é tanto fundamental como misteriosamente inesgotável na sua expansão decimal.

Dado que a sua expansão decimal se prolonga infinitamente, é usual arredondar o valor de π para 3.14. E porque é que isto importa? perguntam. Importa porque no dia 14 de março (14/3), celebra-se o Dia do Pi! Porquê? Porque na nomenclatura anglo-saxónica a data se escreve no formato mês/dia, 3/14, correspondendo aos primeiros algarismos do π. Este dia tornou-se ainda mais especial para os entusiastas da matemática em 2020. Na sua 40.ª Assembleia Geral, a UNESCO aprovou uma moção que proclamou 14 de março como o Dia Internacional da Matemática. Assim, este dia deixou de ser dedicado apenas a um único número e passou a celebrar TODA A MATEMÁTICA! Todo o universo infinito de possibilidades da matemática. TUDO! E tudo isso para explicar o mundo, do infinitamente pequeno ao infinitamente grande. Porque a matemática não é apenas números… é a linguagem do universo!

O astrónomo Robert Matthews combinou dados astronómicos com a teoria dos números para calcular π, demonstrando que essa constante matemática pode emergir naturalmente da observação do cosmos. Utilizando o movimento dos corpos celestes, aplicou conceitos probabilísticos e técnicas estatísticas e demonstrou que π não é apenas um número abstrato da matemática, é um número que surge espontaneamente na estrutura do universo. O estudo reforça a ligação entre matemática e astronomia, mostrando que constantes fundamentais derivam de padrões naturais observáveis. Além de destacar a relevância de π, este estudo sugere que ainda há muito a explorar nas interseções entre números e natureza.

π é um dos números mais misteriosos, universais e fundamentais da matemática. Eis algumas razões porque continua a cativar matemáticos, cientistas e até filósofos:

1. π está presente em toda a natureza. Vai muito além dos círculos e surge em áreas inesperadas da matemática e da física. Aparece em diversas equações astronómicas e físicas, como na fórmula do período orbital dos planetas (derivada da terceira lei de Kepler), no cálculo da densidade média do universo, na equação de Schwarzschild (que define o raio dos buracos negros) e nas equações de campo da relatividade geral de Einstein. A sua ligação intrínseca à estrutura do cosmos sugere que a matemática não é apenas uma construção teórica, mas um reflexo da ordem do universo. A omnipresença de π faz com que pareça uma chave oculta para a compreensão da realidade.

2. É infinitamente misterioso. π é um número irracional, o que significa que não pode ser expresso como uma fração simples. A sua expansão decimal prolonga-se infinitamente sem qualquer repetição periódica. π é também um número transcendental, i.e., não é a raiz de nenhuma equação polinomial com coeficientes inteiros. Apesar de séculos de estudo, não existe uma fórmula simples que o "capture" completamente – apenas aproximações

3. Curiosidades matemáticas. Não há ocorrências da sequência 123456 nos primeiros um milhão de dígitos de π. Os primeiros 144 dígitos de π somam 666 (o "número da besta", Apocalipse 13:18). Na 762.ª casa decimal de π, surge uma sequência de seis noves consecutivos (999999), conhecida como o Ponto de Feynman

4. Desafia os limites humanos. Durante séculos, calcular mais dígitos de π foi um teste ao engenho humano e à capacidade computacional. Desde a geometria e o cálculo infinitesimal até aos supercomputadores, o número de casas decimais conhecidas já ultrapassou os 3 mil milhões. Além disso, a busca por mais dígitos de π é utilizada para testar a potência dos supercomputadores e a eficiência dos algoritmos matemáticos

5. Os mistérios ainda por resolver. Será que π contém todas as sequências numéricas possíveis? Haverá um padrão oculto em π? Até agora parece completamente aleatório, mas provar matematicamente esta aleatoriedade continua um problema em aberto

6. π também é divertido! Do Dia do Pi (em que se comem tartes – pies, em inglês) aos recordes mundiais de memorização de dígitos (o recorde mundial de recitação ultrapassa os 70.000 dígitos!), π tem um apelo cultural e recreativo que transcende a matemática.

Mas há mais! 3/14 é também o dia de aniversário de Albert Einstein, dando ainda mais motivos para os amantes da matemática e da ciência festejarem! Eis-nos a celebrar este dia formidável consigo! Como vê, damos sempre o nosso melhor para lhe arrancar um sorriso.

Simples na sua definição, mas infinitamente complexo na sua essência, π continua a ser um dos conceitos mais fascinantes da história do pensamento humano. A jornada de π ao longo da história destaca o progresso colaborativo e cumulativo da matemática através das civilizações, tornando-o verdadeiramente uma constante universal em todos os sentidos da palavra.

14 de março. Dia do Pi. Dia Internacional da Matemática. Dia da diversidade unificada, diríamos nós. Se a Matemática não é apenas números, mas a linguagem do universo, porque é que o universo acolhe a diversidade e, no entanto, a sociedade ainda resiste à inclusão? A Matemática ensina que cada número, por mais distinto que seja, tem o seu lugar e a sua função. Números naturais, inteiros, racionais, irracionais, imaginários, complexos, algébricos, transcendentais, primos, compostos, perfeitos, abundantes, deficientes, reais, p-ádicos, hipercomplexos, surreais, ordinais, cardinais, hiper-reais, ultraracionais… Todos coexistem num sistema harmónico, sem hierarquias arbitrárias. Todos essenciais na concretização da sua função. Da mesma forma, a humanidade só pode prosperar quando reconhecer o valor de cada indivíduo, independentemente da sua origem, identidade ou condição. Se a própria linguagem do universo é inclusiva, porque havemos de erguer barreiras em vez de construir pontes? Feliz Dia Internacional da Matemática!

 

Fale connosco! Escreva para pxp.cminho@gmail.com 


Crónica publicada no Correio do Minho no dia 15 de março de 2025

Comentários

  1. Muito interessante; para quem quiser ler e pensar um pouco sobre a importância da matemática e a maneira, através dela, podemos ser informados do que nos rodeia. Também interessante o facto deste artigo surgir após o outro do alinhamento dos planetas. Já tinha lido qualquer coisa sobre isso mas, para quem estiver mais atento, escrever sobre o alinhamento daqueles astros e depois sobre o número “Pi”, é simplesmente perfeito … faz todo o sentido!
    Um desafio para a Priscila e para o colega Pedro! Alinhados nesta trajetória de pensamento, juntem Descartes à equação! Partindo dos ensinamentos que este filósofo francês nos deixou, nomeadamente nos domínios da matemática e da física, que conclusões retiram? Estou certo de que virá aí, no seguimento dos dois que já li, um novo artigo de boa e interessante leitura. 👍🙂

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Great minds think alike! o Descartes está em fila de espera desde que falamos dos quadrados perfeitos. Foi ele quem avançou o campo das potências… Estamos mortinhos para fazer a ponte entre Pitágoras e Descartes!

      Eliminar
  2. Gostei do artigo. A matemática não era a minha disciplina
    Posso dizer que não era grande aluna mas também não era má. Era suficiente.
    Há elementos da minha família que foram bons alunos e admiro todos os estudantes que se dedicam ao estudo da Matemática que , em tempos recentes, olhava para os livros e cadernos dos meus sobrinhos, era, para mim o que se diz ," um boi a olhar para um palácio".
    O último parágrafo deste artigo está excelente.
    A imagen é a vida.
    Parabéns.

    ResponderEliminar
  3. Porque havemos de erguer barreiras em vez de construir pontes? Tanto mais que os números são uma das falas inapagáveis do universo que nos iclui, humanos construtores do concreto de cada dia e dos impossíveis como a luz de uma vida sem negrume nem paredes de indignidade? Obrigado. Parabéns. Sempre. E que a Matemática seja uma outra corrente do poético e da fantasia.

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares deste blogue

2025: Um ano quadrado perfeito!

Uma viagem pela tabela de Pitágoras

Não são 6, são 8!