Algo Belo
Ao enfrentar o mundo é fácil sentirmo-nos assoberbados pelas suas adversidades. Tal como o leitor, estamos plenamente conscientes das imperfeições e dos desafios da realidade. Ainda assim, escolhemos direcionar as nossas reflexões para a beleza. Quando falamos do “belo”, não o fazemos em oposição à “fealdade”. Falamos da beleza como fonte milenar de inspiração, motor de progresso científico e agente de transformação.
A ideia de que "nos números está a natureza de todas as coisas" (ἐν τῷ ἀριθμῷ δέ τε τὰ παντ' ἐπέοικε) é frequentemente associada à escola pitagórica, refletindo a crença de que a essência do universo reside nos números e nas proporções matemáticas. Já o conceito de "música das esferas" – atribuído a Pitágoras e retomado por filósofos como Platão – sugere que os planetas em movimento geram uma harmonia inaudível, fruto das relações matemáticas entre os corpos celestes e as suas órbitas. Para os filósofos antigos, essa harmonia estava intrinsecamente ligada à perfeição e à beleza da ordem cósmica. Ainda hoje, os princípios matemáticos de equilíbrio e de simetria continuam a desempenhar um papel fundamental na ciência, na música, na arquitetura e nas belas artes.
No seu livro A Beautiful Question (Uma Questão Bela), Frank Wilczek – Prémio Nobel de Física em 2004 – escreveu: “A visão de mundo deles [Escola Pitagórica] centrava-se na admiração reverente dos números e da harmonia musical, que viam como reflexos da estrutura profunda da realidade. (Como os dois mil anos seguintes demonstraram, estavam no caminho certo.)”. Além disso, na descrição do livro pode ler-se: “O trabalho inovador de Wilczek na física quântica foi inspirado pela sua intuição de procurar uma ordem mais profunda de beleza na natureza. [...] Essa busca tem sido a essência da investigação científica desde Pitágoras, o antigo grego que foi o primeiro a afirmar que 'todas as coisas são número', até Galileu, Newton, Maxwell, Einstein e nas profundezas da física do século XX. [...] Sim: o mundo é uma obra de arte, e as suas verdades mais profundas são aquelas que já sentimos, como se estivessem de alguma forma escritas nas nossas almas.”
Por falar em Isaac Newton… o físico, matemático e astrónomo inglês utilizou as leis do movimento planetário de Johannes Kepler como ponto de partida para desenvolver a sua teoria da gravitação. Kepler (1571–1630), astrónomo e matemático alemão, foi um dos primeiros cientistas a adotar e refinar o modelo heliocêntrico de Copérnico (1473–1543). Demonstrou que os planetas descrevem órbitas elípticas em torno do Sol, em contraste com as órbitas circulares propostas por Copérnico. Formulou as Três Leis do Movimento Planetário, que descrevem o comportamento das órbitas planetárias com grande precisão matemática: a lei das órbitas elípticas, a lei das áreas e a lei dos períodos. Contudo, Kepler não identificou a força responsável por esses movimentos.
Esse passo foi dado por Newton (1643–1727), que formulou a Lei da Gravitação Universal, proporcionando uma explicação física para as leis de Kepler. Pode dizer-se, assim, que Kepler descreveu o comportamento do movimento planetário, enquanto Newton explicou a sua causa. Ao basear-se em observações rigorosas e na matemática para descrever as órbitas dos planetas, Kepler lançou as bases da astronomia moderna. Por sua vez, Newton demonstrou que a força que atrai os planetas em direção ao Sol é a mesma que faz os objetos caírem na Terra: a gravidade. Ao unificar os movimentos celestes e terrestres sob as mesmas leis físicas, Newton formulou uma teoria física universal, algo verdadeiramente revolucionário para a sua época.
Agora que falamos sobre os movimentos dos planetas, não deixa de ser verdade que eles, ainda assim, se movem de formas misteriosas (parafraseando a canção dos U2). Apesar de o nosso conceito de beleza não estar associado às passerelles da moda, pode dizer-se que, por vezes, os planetas também "desfilam".
Um desfile planetário é um fenómeno astronómico que ocorre quando vários planetas do Sistema Solar se alinham de forma visível no céu. Na verdade, os planetas não ficam perfeitamente alinhados numa linha reta, o que se observa é uma sequência de planetas visíveis, próximos uns dos outros, formando uma espécie de "alinhamento" parcial ou uma distribuição ao longo de um arco. Este fenómeno é relativamente raro, porque para que um desfile planetário seja visível a partir da Terra vários fatores devem coincidir, como por exemplo as posições orbitais dos planetas e a sua visibilidade em determinado período do ano. Assim, a visualização dos planetas alinhados ao longo do céu é um espetáculo notável que capta a atenção de astrónomos e curiosos.
Ao longo do mês de janeiro desfilaram seis planetas: Vénus, Marte, Júpiter e Saturno (visíveis a olho nu), além de Úrano e Neptuno, que não podem ser observados sem telescópio devido ao seu brilho fraco e à grande distância da Terra. Com binóculos ou telescópios, foi possível observar detalhes incríveis, como as luas de Júpiter ou os anéis de Saturno, tornando a experiência ainda mais fascinante para os entusiastas da astronomia. Os cientistas também valorizam esses alinhamentos planetários, porque a análise das posições relativas dos planetas e dos seus efeitos gravitacionais contribui para aprofundar o conhecimento sobre o movimento e a mecânica do nosso Sistema Solar. Em fevereiro, sete planetas estarão alinhados — mantenha os olhos no céu!
Os desfiles planetários oferecem uma oportunidade extraordinária para a observação astronómica, proporcionando uma visão deslumbrante do Sistema Solar que revela a harmonia e a grandiosidade do cosmos. Estes eventos convidam-nos a refletir sobre a vastidão do espaço e a ponderar o nosso lugar nele. São, também, um apelo a fazer uma pausa na rotina e contemplar a nossa profunda ligação com o universo.
Entre o ruído e a azáfama do dia a dia, momentos como este oferecem uma rara sensação de quietude. Ao erguer o olhar e contemplar os planetas alinhados no céu, é impossível não sentir uma conexão — um vínculo com os antigos que, há milénios, se maravilharam com as estrelas; e uma ligação com todas as outras pessoas sob este céu partilhado.
Esta crónica é dedicada ao Pedro Sousa Basto-Filho. Que tenha um dia de aniversário maravilhoso e que a sua felicidade cresça sempre. Entre pai e filho existe um elo inquebrável, um amor profundo e eterno. Esse é, sem dúvida, o maior e mais belo presente que um filho pode receber. PARABÉNS 

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